sábado, 18 de abril de 2015

Constituição – PI no anedotário

Por Miguel Dias Pinheiro, advogado

Com a polêmica da escolha do novo conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Piauí (TER-PI), descobriram-se que a Constituição Estadual comete até mesmo erros gramaticais, além, claro, das inúmeras incongruências jurídicas, burlas e ofensas à ordem constitucional federativa.

No art. 81, da Constituição do Piauí, há um erro gramatical gritante, capaz, inclusive, de colocar outra vez o Estado no anedotário jurídico nacional. Aliás, a norma é inédita no mundo, quando o nosso legislador fica em dúvida quanto à conjugação e concordância do verbo “reunir”.

Observemos esse absurdo: Art. 81 Além dos casos previstos no Regimento Interno, a Assembléia Legislativa se reunirá (reunira-se-á) especialmente, para: (...)

É a primeira lei no mundo que existe uma correção gramatical entre parênteses para regulamentar as reuniões no parlamento estadual do Piauí. Além da dúvida do nosso legislador, ele comete outro erro ainda mais grave, quanto à concordância e a conjugação correta da locução do verbo reunir. “Reunir-se-á” (e jamais “reunira-se-á” - e muito pior “se reunirá”) seria a locução correta e aplicável quando se trata formalmente de técnica legislativa na elaboração de uma lei, de um texto legal, sobretudo de uma Constituição.

Como parâmetro de legalidade, aplicando-se a técnica legislativa, veja o que dita de forma escorreita a Constituição Federal, comparativamente: “Art. 57. O Congresso Nacional reunir-se-á, anualmente, na Capital Federal, de 2 de fevereiro a 17 de julho e de 1º de agosto a 22 de dezembro. (“Caput” com redação dada pela Emenda constitucional nº 50, de 2006)”.

A locução “vai se reunir” ou “vai reunir-se”, chamada também de “perifrástica”, conjugação constituída por um verbo principal no infinitivo ou no gerúndio e um verbo auxiliar no tempo que se quer conjugar, é a mais usada em linguagem coloquial, no cotidiano. Quando o legislador quer construir ou tornar um texto legal absolutamente formal, usa a locução “reunir-se-á” para designar reunião de parlamentos, sendo, pois, inaplicável “se reunirá” ou “reunira-se-á”.

Técnica Legislativa, como por imposição legal devem ter conhecimento os operadores do Direito, é o conjunto de procedimentos e normas redacionais específicas, que visam à elaboração de um texto que terá repercussão no mundo jurídico. O processo legislativo é a parte administrativa da elaboração da norma legislativa, regulamentado na Constituição Federal envolvendo diversas fases. Em suma, é a parte substancial onde se concentram as normas de convívio social. Na elaboração de uma lei não pode subsistir dúvida. E no caso o mais grave foi admitir a “dúvida gramatical”. Pior: com erro crasso, estúpido.

Maricy Valletta nos ensina que “a elaboração legislativa exige, acima de tudo, bom senso e responsabilidade, pois as leis interferem, direta ou indiretamente, na vida das pessoas. Uma lei mal feita pode surtir o efeito contrário do esperado, trazendo ainda mais dúvidas à questão que se pretendia esclarecer, e dando margem a desnecessárias batalhas jurídicas”. E orienta no sentido de que legislador deverá sempre primar por “usar frases impositivas”; “construir as orações na ordem direta, evitando adjetivações dispensáveis”; “buscar a uniformidade do tempo verbal (preferência tempo presente ou futuro simples do presente)”; “observar regras de pontuação”; “articular a linguagem, técnica ou comum, de modo a ensejar perfeita compreensão do objetivo da lei”; e “evitar o emprego de expressão ou palavra que possibilite duplo sentido ao texto”.

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