segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Ministério da Educação aprova aumento da carga-horária dos cursos de licenciatura

Letícia Larieira

O Ministério da Educação homologou parecer do Conselho Nacional da Educação que prevê aumento da carga horária dos cursos de licenciatura no Brasil. A resolução deve ser implementada por todas as instituições de ensino do país nos próximos dois anos e determina um aumento na carga horária dos cursos de licenciatura no país, de três para quatro anos de formação, contabilizando 3200 horas. Para docentes interessados em fazer uma segunda licenciatura, a carga horária pode variar de 800 a 1200 horas. O documento também determina novas regras para a formação continuada: os cursos de atualização devem ter carga horária entre 20 e 80 horas.
Segundo a nova diretriz, a formação de professores deve priorizar atividades práticas e voltadas para o dia a dia em sala de aula. Um dos núcleos dos cursos de formação será focado em “atividades práticas articuladas entre os sistemas de ensino e instituições educativas de modo a propiciar vivências nas diferentes áreas do campo educacional, assegurando aprofundamento e diversificação de estudos, experiência e utilização de recursos pedagógicos”, de acordo com o artigo 12 do documento. Ainda segundo o texto, a carga horária de estágios obrigatórios supervisionados será de 400 horas.
De acordo José Fernandes de Lima, conselheiro da câmara de Educação Básica do CNE, a decisão de aumentar as horas em sala de aula durante a formação visa melhorar a qualidade da Educação no país. Segundo ele, “a medida parte do princípio de que sem docentes qualificados e com autonomia para o desempenho do seu papel nós não teremos as melhorias desejadas”. Atendendo às demandas de uma formação mais voltada para o ambiente escolar e o dia a dia em sala de aula, o conselheiro ressalta que o aumento de horas/aula será voltado principalmente para as atividades práticas. “Ao elevarmos a nova carga horária mínima, ampliamos o núcleo de formação mais relacionado à interação dos professores com a escola”, defende.
Para o conselheiro, o documento responde a demandas da sociedade e dos sistemas educacionais e incentiva uma formação de professores de acordo com as necessidades de aprendizagem dos alunos. Segundo ele, “a resolução revela de forma mais detalhada e específica o perfil do professor que queremos formar”. Quanto aos objetivos de longo prazo de resolução, para os próximos anos, a expectativa é de que as novas diretrizes da resolução ampliem nas escolas e redes de ensino o debate sobre a formação docente, assim como mais atenção do Ministério da Educação ao tema.
Fernando Luiz Abrucio, doutor em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas e presidente da Associação Nacional de Ensino e Pesquisa do Campo de Públicas (ANEPCP), defende que o aumento da carga horária, ainda que insuficiente, possa ser um estímulo ao que ele chama de tripé do processo de formação, uma interligação entre universidades, redes de ensino e escolas. “Essa medida vai obrigar a universidade a ampliar a experiência para além da sala de aula, pode gerar uma demanda de parte dos estudantes de pedagogia a ter um espaço maior nas escolas e as redes poderiam aproveitar isso como mecanismo para ampliar o número de profissionais dentro das unidades de ensino”.
Os números do magistério
De acordo com dados do Censo Escolar 2014, apenas 74,8% dos professores da Educação Básica possuíam diploma de Ensino Superior em 2013. Ainda segundo o levantamento, 48,3% dos professores do Ensino Médio eram licenciados na área de atuação, enquanto nos Anos Finais do Ensino Fundamental a porcentagem é de apenas 32,8%.
Embora admitida na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) a formação em nível médio para professores da Educação Infantil e dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, a Meta 15 do Plano Nacional de Educação prevê que até este ano 100% dos docentes da Educação Básica tenham formação superior. Até 2024, todos que lecionam nos Anos Finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio deverão ter licenciatura na área de atuação.
Lima ressalta que já é consenso entre teóricos da área que todos os professores atuantes na Educação Básica devem ter formação superior; porém, na prática, o país ainda não definiu um prazo ou políticas públicas para avançar nesse sentido. “Na LDB de 1996 definia-se que em dez anos todos os profissionais deveriam ter nível superior; porém, de lá para cá foram retomadas as alternativas de formação docente em nível médio mais uma vez. Sendo assim, essa questão continua sem ser resolvida”, afirma o conselheiro.
O lado dos professores
Carlos Henrique Vieira, professor de português em uma escola estadual em São Paulo, concluiu a licenciatura em português/inglês em 2013. Para ele, embora o curso trouxesse conteúdos relevantes para sua formação, a maior dificuldade depois de formado foi aplicar esses conhecimentos em sala. Segundo o professor, “ainda que as disciplinas do curso agregassem, ficou faltando o caminho para fazer essa transposição; muitas vezes, depois de graduado eu me perguntei quando utilizaria o que eu vi na universidade”.
Já Ariete Usmiany, professora de ciências biológicas da rede pública de São Paulo, tem uma visão oposta: muitas vezes, algumas das noções adquiridas durante a licenciatura não são colocadas em prática em sala de aula. De acordo com a docente, “é sempre dito ao futuro professor que ele deve inovar para atrair a atenção dos alunos, mas às vezes as redes boicotam isso um pouco e não conseguimos colocar em prática tudo o que aprendemos.
Quanto à nova carga-horária dos cursos de licenciatura, ambos os docentes concordam: o tempo de estudos em sala não necessariamente significará uma melhora na formação de professores. “Eu não acredito que o aumento da carga-horária resulte numa mudança para quem está se formando nas universidades hoje; eu acho que precisa ser discutido o que precisa ser ensinado e como vai ser ensinado desde o começo do curso”, defende Carlos.
Ariete, por sua vez, acredita que embora a ampliação não ajude todos os futuros docentes, pode ser útil para alguns. Na opinião dela, “a dedicação aos estudos depende da pessoa e de como é a vida dela enquanto está estudando; tenho colegas que deixaram o emprego para fazer o estágio obrigatório e acabaram se prejudicando, por isso acredito mais em uma flexibilização dos cursos do que apenas no aumento da carga-horária”.
O Papel do CNE
Instituído em 1995, o Conselho Nacional de Educação nasceu com o objetivo de auxiliar a Política Nacional de Educação, aprimorando e consolidando uma Educação nacional de qualidade. Assegurando a participação da sociedade, o CNE é um órgão independente associado ao Ministério da Educação, que tem entre suas funções regulamentar diretrizes, emitir resoluções e pareceres, promover debates acerca do tema e auxiliar o ministério em identificar e solucionar problemas.
Resultantes de análises técnicas feitas pelo conselho, os pareceres são avaliados e homologados ou reprovados pelo MEC. Quando aprovado, um parecer torna-se uma resolução, que estabelece regras e normas a serem cumpridas e observadas por todos os sistemas e estabelecimentos de ensino em todas as etapas e modalidades.
 

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