quinta-feira, 27 de novembro de 2014

A CONAE 2014 DEIXA O SEU RECADO PARA O MEC E O GOVERNO DILMA

Por ocasião da Conae (Conferência Nacional de Educação), que aconteceu entre 19 e 23 de novembro em Brasília, a presidente Dilma Rousseff discursou para mais de 3.000 gestores, pesquisadores, conselheiros, profissionais, estudantes, familiares, além de ativistas dos movimentos sociais pela educação. Sua principal mensagem foi: "preciso de sugestões e de caminhos para construir um país mais desenvolvido". Um pouco antes, assinalou que a "educação é a prioridade das prioridades, a número um de nosso modelo de crescimento com inclusão social".
A qualidade da educação depende de muitos fatores. Um dos principais é o aumento do financiamento da educação pública. Os cálculos são razoavelmente conhecidos. E boa parte do dinheiro novo necessário precisa vir do Governo Federal.
Como já assinalado, é importante reiterar que o compromisso firmado pela presidente, Dilma Rousseff, foi feito na Conae, o mais importante instrumento de participação social da área. Trata-se de um processo político extenso e amplo. O ciclo é iniciado nas etapas municipais, avança para etapas intermunicipais, progride para etapas estaduais, até alcançar a etapa nacional. Ao todo, envolve milhões de brasileiros. Como vinha sendo sinalizado desde as primeiras atividades, os conferencistas deram sinais claros e unânimes ao Palácio do Planalto.
Os temas centrais da Conae foram a implementação do PNE (Plano Nacional de Educação) – recém sancionado – e a regulamentação do SNE (Sistema Nacional de Educação). Segundo a deliberação dos delegados, no tocante à educação básica, ficou decidido que o CAQi (Custo Aluno-Qualidade Inicial) e o CAQ (Custo Aluno-Qualidade) são os mecanismos basilares para a consagração do direito à educação pública, tornando realidade as metas do PNE e materializando, posteriormente, o SNE.
O problema é que, apenas para as matrículas atuais, o CAQi demanda cerca de R$ 37 bilhões de dinheiro novo, a serem transferidos por ano da União para Estados, Distrito Federal e Municípios – e o Brasil ainda precisa expandir muitas vagas em creches, pré-escolas, ensino fundamental e ensino médio. Ou seja, a demanda por recursos é crescente e, considerando a educação superior, alcança a um patamar equivalente a 10% do PIB de investimento público em educação pública.
Diante dessas necessidades, o MEC (Ministério da Educação), principal interlocutor do governo no tema, está há mais de quatro anos protelando a regulamentação do CAQi, criado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação a partir de 2002.
Com isso, o Governo Federal tem atrasado o processo para a adoção do valor justo e necessário para o Brasil melhorar as condições de infraestrutura das escolas e de valorização dos profissionais da educação. Ambos são fatores essenciais para melhorar a chamada relação de "ensino-aprendizagem" nas unidades escolares brasileiras, tal como determina a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).
Há muitos caminhos para viabilizar o CAQi. O melhor deles é a homologação do parecer e da proposta de resolução da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação CNE/CEB 8/2010, redigida por meio de um inovador termo de cooperação firmado entre a Campanha Nacional pelo Direito à Educação e o órgão. Contudo, sem a homologação, esse instrumento normativo não pode entrar em vigor. Apenas em janeiro desse ano, o MEC encaminhou ponderações ao CNE sobre o tema. Quase quatro anos após ser aprovado por unanimidade no órgão, inclusive com o voto de representantes do próprio MEC.
Como funciona o CAQi?
O CAQi estabelece o padrão mínimo de qualidade na forma de insumos escolares. Em outras palavras, todas as escolas públicas brasileiras devem ter professores que recebam, ao menos, o Piso Nacional Salarial do Magistério (cerca de R$ 1.700 por 40 horas de jornada semanal, com destinação de 1/3 da jornada para atividades extraclasse). Devem ter também garantida uma política de carreira atrativa, formação continuada e a possibilidade de ministrar aulas para turmas com o número de alunos adequado. Além disso, todas as unidades escolares devem ter bibliotecas, laboratórios de ciências, laboratórios de informática, quadra poliesportiva coberta, entre outros insumos infraestruturais.
Já o CAQ representa um esforço de aproximação do padrão de investimento praticado no Brasil daquele verificado nos países mais desenvolvidos em termos educacionais.
Tanto o CAQi como o CAQ constam do PNE. Segundo a Lei 13.005/2014, que estabeleceu o novo plano educacional com vigência até 2024, o Custo Aluno-Qualidade Inicial deve ser implantado até junho de 2016. Mas, para isso, ele precisa ser regulamentado com urgência.
Diante de todo esse contexto, a Conae aprovou que o MEC deve instituir uma comissão de negociação, envolvendo a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, o CNE e outras entidades capazes de colaborar com o tema, para estabelecer caminhos para implementação do CAQi. O prazo dado para finalizar esse trabalho é maio de 2015, quando o instrumento normativo CNE/CEB 8/2010 completará cinco anos sem ser homologado. Além desse aspecto simbólico, maio é praticamente o último mês para que o CAQi conste nas propostas de leis orçamentárias de 2016, prazo máximo para ele sair do papel.
É importante mencionar que, se dependesse da posição das etapas municipais, intermunicipais e estaduais, a homologação deveria ocorrer em até dois meses após a publicação do Documento Final da Conae. Ou seja, em janeiro. Mas por acordo de redação, os delegados e delegadas foram sensíveis ao pedido do MEC.
A solução para o dinheiro novo demandado pelo CAQi também foi dada pelos conferencistas: deve ser ampliada a complementação da União ao Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação). Hoje o Governo Federal coloca quase R$ 10 bilhões nesse sistema de financiamento. Parece muito, mas é um valor insuficiente.
Para viabilizar o CAQi, a participação da União no Fundeb deveria ser de quase R$ 47 bilhões. A diferença entre a demanda total e o que é realizado hoje é de R$ 37 bilhões. Segundo mais uma deliberação da Conae, esse montante deve vir da transferência integral de recursos arrecadados pelo Governo Federal por meio do fundo social do pré-sal, além de royalties, bônus e participações especiais resultantes da exploração de petróleo e demais minerais. Além disso, no começo, será preciso um esforço orçamentário adicional por parte do Poder Executivo federal.
Devido à experiência no exercício do controle social, para que todo esse dinheiro seja transferido e bem utilizado, os conferencistas exigiram a transparência e propuseram mecanismos que, caso saiam do papel, garantirão lisura e bom uso do recurso público.
A implementação do CAQi tem outra vantagem: gerará justiça federativa. Com a ela, além do país alcançar, em 2016, um patamar de investimento público em educação pública próximo a 6,3% do PIB (hoje investimos cerca de 5,5% do PIB), a União terá uma participação maior nesse bolo.
Em 2012, último ano com dados oficiais, o Governo Federal colocou apenas R$ 0,18 a cada R$ 1,00 investido na área. Com o CAQi passará a dividir equitativamente a conta, alcançando R$ 0,31 a cada R$ 1,00 aplicado. Nessa nova distribuição, os Estados e o Distrito Federal colocariam R$ 0,34 e os municípios R$ 0,35. Hoje os primeiros colocam R$ 0,40 e os segundos R$ 0,42.
O recado é antigo. Agora Dilma vai ouvir?
Em síntese, a Conae indicou para a presidente Dilma Rousseff e para o MEC que quer uma justa e decisiva participação do Governo Federal na educação básica. Verdade seja dita, desde a Conferência Nacional de Educação Básica (Coneb-2008) e da primeira Conae (2010), o recado é o mesmo.
Frente a uma eleição muito apertada, resta saber se dessa vez o Palácio do Planalto vai ouvir a voz dos conferencistas. A presidente, Dilma Rousseff, disse que sim. Será inédito, pois até aqui isso nunca aconteceu.

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