domingo, 20 de dezembro de 2015

Sem ‘impeachment’, a vez do “jagunço’

Por Miguel Dias Pinheiro, advogado

Golpeada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no polêmico “impeachment” da presidente da República, a oposição brasileira, frustrada, agora busca outro foco para cassar a chapa Dilma/Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por suposta irregularidade nas contas de campanha dos governistas.

À frente desse novo foco, o ministro Gilmar Mendes, conhecido no meio político-jurídico de Mato Grosso e Minas Gerais como “jagunço” do PSDB. Ele ascendeu à Suprema Corte por escolha do então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso (FHC). O ministro integra o TSE e foi quem desarquivou a prestação de contas da campanha eleitoral do PT, que tinha sido aprovada após a eleição de 2014. Com Eduardo Cunha enlameado, vivendo um “inferno astral”, e Michel Temer mais sujo que pau de galinheiro, Gilmar Mendes agora vai para a “vitrine oposicionista” como o novo “carrasco” da presidente Dilma. Os perdedores da eleição de 2014 creditam a ele o homem que possa impor um novo “golpe” no para destronar Dilma, levando com ela o vice-presidente da República.

O novo “golpe” estaria sendo engendrado de forma a passar para a opinião pública a idéia absurda de uma nova eleição presidencial. Ocorre, no entanto, que se o TSE julgar pela cassação da chapa Dilma/Temer, quem assumirá o país será a chapa perdedora Aécio/Aloísio. A história de nova eleição é balela. Uma forma de confundir a opinião pública e não passar a impressão de que o plano beneficiará diretamente a chapa tucana. Gilmar Mendes, então, agirá nos bastidores para colocar Aécio e Aloísio no Planalto. Como o projeto “Temer presidente” falhou com a decisão do STF sobre um provável “impeachment”, buscar-se-á via Gilmar Mendes outro “golpe” com cunho de legalismo no TSE.

No processo de prestação de contas desarquivado por Gilmar Mendes no TSE, uma mesma empresa que doou ao PT e ao PSDB é criminalizada. No seu “estrabismo ideológico”, Mendes criminaliza as doações feitas ao PT e sacraliza as feitas ao PSDB. Dinheiro doado ao PT é sujo e fedorento; ao PSDB, limpo e cheiroso. Em despacho proferido no respectivo processo, o ministro indica "potencial relevância criminal" na campanha petista. Sobre as doações para a campanha tucana, ele “endeusa-as”. Segundo o jornalista Paulo Nogueira, “tivesse FHC, ou algum sucessor tucano, a oportunidade e o tempo de nomear todos os juízes do STF, teríamos 11 Gilmares”.

Joaquim Barbosa, quando ministro do STF, chegou a chamar Gilmar Mendes de “jagunço de Diamantino”. “Vossa excelência está destruindo a Justiça desse país e vem agora dar lição de moral em mim! Saia à rua, ministro Gilmar! Saia à rua e faça o que eu faço! Vossa excelência não está na rua, não. Vossa excelência está na mídia destruindo a credibilidade do Judiciário brasileiro”, acusou Barbosa em uma discussão acalorada no STF. Segundo Gilmar Crestani, “se o STF usasse para julgar Gilmar Mendes os mesmos fundamentos com que condenou os petistas, ele já estaria preso há muito tempo. O que admira não é que alguém deixado no STF por FHC cometa tantas imbecilidades. O que assusta é ver a manada de “midiotas” que não se dá conta disso”.

Embora seja a derradeira indicação tucana à corte mais importante do país, Gilmar Mendes sozinho faz muito barulho e se tornou uma das principais fontes de dor de cabeça da presidente Dilma Rousseff. "As posições dele são muito mais políticas do que jurídicas", acusa o jurista Dalmo Dallari, professor emérito da USP. "Essa ação (no TSE) não vai dar em nada porque não tem nenhum fundamento jurídico. Empresa doar para campanha eleitoral era regra. Isso não configura uma ilegalidade", acrescenta.

"Isso é contrário à ética e à probidade administrativa, estando muito longe de se enquadrar na 'reputação ilibada' exigida pelo artigo 101 da Constituição, para que alguém integre o Supremo", escreveu Dallari em um artigo na época das revelações no polêmico episódio que envolveu Gilmar Mendes na soltura por “habeas corpus” (duas vezes) do banqueiro Daniel Dantas, preso na Operação Satiagraha sob suspeita de desvio de verbas públicas, crimes financeiros e tentativa de suborno para barrar a investigação da Polícia Federal. O grupo Opportunity, de Daniel Dantas, adquiriu participações em várias empresas privatizadas no governo FHC, em especial no setor de telecomunicações.

Na opinião de Maurício Dias, na Revista Carta Capital, Gilmar Mendes é um “tucano de toga”. “Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), pode gabar-se de ser sincero. Se assim for, não poderá deixar de admitir que, inelutavelmente, é parcial. No caso dele, a transparência de suas observações mostra que ele é uma toga a serviço de objetivos políticos, preferencialmente sintonizados com a oposição. Prioritariamente, o PSDB. Faz sentido o amor partidário que bate no peito de Gilmar. Projetou-se para a vida pública no governo Fernando Henrique Cardoso, no qual foi também integrante da AGU. Por indicação de FHC, em junho de 2002, fez a travessia para o STF. (...) Homem frio”.

Portanto, a conduta ética de Gilmar Mendes está longe de ser consenso. O embate com o governo petista não é de hoje e já rendeu ao ministro a pecha de "líder da oposição” nos embates dos tribunais.

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